Seis anos da Casa Florescer: Instituição já acolheu quase 600 mulheres trans e travestis em situação de vulnerabilidade social

Fachada da Casa Florescer, onde mulheres trans e travestis são acolhidas

O Centro de Acolhida Especial para Travestis e Mulheres Transexuais Casa Florescer iniciou suas atividades em março de 2016, fica localizada no bairro do bom retiro em  São Paulo. Aos seis anos de idade, a casa já acolheu 597 mulheres trans e travestis em situação de vulnerabilidade social. Desse total, 153 conquistaram autonomia e seguem trabalhando e se sustentando com dignidade.

São duas casas de acolhimento, a primeira e aniversariante do mês, possui  30 vagas, destinadas a mulheres transexuais e travestis que sofreram com a exclusão do ambiente escolar e dificuldades com a convivência familiar devido a identidade de gênero, falta de oportunidades, preconceito e outras violações de direitos. 

A unidade conta com um atendimento 24 horas de acolhimento. O espaço contempla 4 dormitórios, sendo um deles para pessoa com deficiência, refeitório, área de convivência, cozinha, sala deatendimento social, sala atendimento psicológico, lavanderia, sanitários e quadra poliesportiva.

“Percebo que quando inauguramos a Casa Florescer, em março de 2016, era algo bastante novo e ousado no sentido de entender as narrativas do corpo da mulher travesti, da narrativa das mulheres transexuais e que viviam nessas violências diversas, que não são apenas questões ligadas à exclusão total família e da sociedade, mas a exclusão do sonho, da vida, o não acesso à rede”, disse o coordenador da instituição, Alberto Silva.

“Queremos entender essa história e mostrar que, independente do que foi vivenciado, é possível construir uma outra narrativa, um leque de articulação que faça com que esse espaço crie uma narrativa de conexão mais forte e mais assertiva.”

Contexto 

Segundo dados da ONG Transgender Europe, o Brasil é o país que mais mata, em números absolutos, pessoas trans no mundo. Pelo menos 175 mulheres transexuais e travestis foram assassinadas em 2020, de acordo com dossiê anual da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra). Além disso, dados da União Nacional LGBT apontam que a expectativa de vida de uma pessoa transgênero no Brasil é de apenas 35 anos. Dezoito anos após a criação do Dia Nacional da Visibilidade Trans, comemorado sempre em 29 de janeiro, ainda é extremamente grande a necessidade de implementação de políticas públicas para essa população.

“Quando pensamos sobre a realidade da desigualdade existente no (Cis)Tema, nos deparamos com a invisibilização de pessoas trans, o cenário fica mais crítico quando acrescentamos os desafios que essa população vive quando está em situação de rua. É importante afirmar que antes mesmo do distanciamento social imposto pela pandemia de Covid-19, a nossa população trans já vivia o isolamento social diário, intensificando ainda mais as vulnerabilidades.”

“Percebo, enquanto gestor de projetos sociais para pessoas trans, que falta maior coesão política. Agora temos algumas representantes na política que trazem esse olhar, mas precisamos fortalecer junto a outros grupos, buscando trazer um direcionamento mais eficaz, ou seja, uma articulação mais coesa, entendendo as vulnerabilidades dos corpos trans. Independente das questões partidárias, temos buscado fortalecer esse viés”, afirma Alberto.

Segunda Unidade 

Em novembro de 2019, com foco na inclusão de gênero, a Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social (Smads) de São Paulo, inaugurou o Centro de Acolhida Especial (CAE) Casa Florescer II voltado para mulheres transexuais e travestis, em Tucuruvi, região norte da capital. O espaço, também com funcionamento 24 horas, abriga outras 30 conviventes.

As duas casas oferecem alimentação completa em diferentes turnos (café da manhã, almoço, lanche, jantar e ceia), higiene pessoal, acolhimento, atendimento socioeducativo e psicológico, encaminhamentos para rede socioassistencial. As conviventes podem participar de oficinas, rodas de conversa, palestras internas e externas, festas, assembleias, filmes, passeios, construção e acompanhamento do Planejamento Individual de Atendimento.

A estrutura da Casa Florescer II também conta com um dormitório coletivo, cozinha com dispensa, almoxarifado, bagageiro, lavanderia, seis banheiros, sendo um com acessibilidade para pessoas com deficiência, sala de convivência, sala para atendimento individual, sala administrativa, refeitório e área externa.

“A segunda unidade veio junto com a inauguração da casa dos meninos trans, então tem tido uma reflexão sobre essas ações enquanto política. Como a gente acolhe, como a gente entende, se capacita e se articula para fortalecer”, disse Alberto.

A intenção é que, após o período de acolhimento nas Casas, essas mulheres possam seguir a vida com autonomia. Por isso, a permanência na instituição é de caráter temporário.

Reflexos da Pandemia 

Alberto explica que, diante das adversidades da pandemia, as pessoas trans e travestis precisaram lidar com o isolamento, que começa muito cedo, com a expulsão da escola, da família. “Durante a pandemia tivemos de lidar com uma instabilidade emocional muito grande e compreender que precisaríamos ajudar também as meninas que já haviam saído da casa para autonomia, mas que agora estavam passando por um momento de medo, e redução do orçamento devido à redução da carga horária de trabalho.”

“Houve o receio de que essas pessoas voltassem para a prostituição como forma de subsistência e lutamos para que elas conseguissem entender que nós estávamos juntos na luta delas, nesse processo diário”, explicou Alberto.

“Quando veio a pandemia, precisamos parar com todas as nossas ações presenciais. As ações remotas já geram esse distanciamento, as pessoas carecem do contato, do olhar, elas necessitam da fala, do abraço. Então foi um processo bastante desafiador.”

No entanto, o coordenador conta que a instituição conseguiu fornecer uma retaguarda no sentido de prover cestas básicas, testes de covid, e quando aconteceram alguns casos positivos para o novo vírus essas pessoas conseguiram ir para o isolamento. Neste contexto, a equipe da Casa Florescer fazia contato frequente por telefone para que elas não se sentissem desamparadas. “A luta delas é nossa luta.”

Futuro da Casa 

Alberto conta que o maior sonho de quem atua na Casa é que um dia sua existência não seja mais necessária. “Nossa perspectiva para o futuro é de que essas mulheres estejam redesenhando sua própria história, como várias outras que já saíram dali, que se encontram no mercado de trabalho, que são os cases de sucesso, de transformação e de ressignificação, mostram que é possível narrar outra história.”

“O que nós gostaríamos para o futuro é que não precise existir mais a Casa Florescer, que as pessoas consigam entender a complexidade do que é ser gente”, enfatiza Alberto. “É possível você sonhar, é possível acreditar, é possível você estar viva.”

Casa Florescer 

Telefone: (11) 3228-0502 | Clique aqui para apoiar

Reportagem de 02/03/2022 | Confira a matéria original clicando aqui.

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